Prof. MSc. Luiz Jorge Dias
Geógrafo - Mestre em Sustentabilidade de Ecossistemas
Geógrafo - Mestre em Sustentabilidade de Ecossistemas
No Pleistoceno Terminal (entre 120.000 e 12.000 A.P.), a Amazônia era apenas uma ampla extensão de savanas e a floresta estava distribuída em alguns lugares mais úmidos, em especial nas margens dos rios, bem como em áreas serranas. Nessa época, a região amazônica era habitada por grandes animais que compunham a denominada megafauna, como os mastodontes, os tigre-de-dentes-sabre, os megatériuns (ou preguiças gigantes), dentre outros cujos fósseis foram encontrados em barrancos dos rios amazônicos.
Ecologicamente, uma explicação bem sucinta para a expressiva biodiversidade da Amazônia é explicada através da Teoria dos Redutos e Refúgios, que explicam que no Pleistoceno Terminal, as matas teriam ficado reduzidas a pequenas reservas, as quais se convencionaram denominar de redutos. Isso teria ocorrido em períodos glaciais. Durante a glaciação, o clima ficava mais seco e frio, enquanto algumas áreas com maior umidade seriam ideais para os redutos de matas (AB’SÁBER, 2003; 2004; 2006b).
Nesse sentido, a ocupação humana da Amazônia ocorreu praticamente com a expansão holocênica da floresta (últimos 10.000 anos), o que implica afirmar que os primeiros grupos humanos a habitarem a floresta eram provenientes da Ásia e eram povos nômades formados por populações de caçadores e coletores, os quais obtinham do meio tudo que era necessário para sua sobrevivência sem agredir a natureza.
As mudanças climáticas ocorridas naquele período foram um dos fatores essenciais que contribuíram para o aumento da temperatura média global e macro-regional e, com isso, as florestas foram se expandindo, tendo em vista que o calor estava associado ao aumento da umidade, que se materializou processualmente na forma de chuvas intensas e constantes no pré-espaço total amazônico.
Juntamente com as mudanças dos climas globais holocênicos, dá-se início a uma nova fase de povoamento da Amazônia: os novos grupos passaram a contar com novos recursos alimentares mais diversificados, daí originando novas organizações sociais, as quais podem ser chamadas de “Cultura da Floresta Tropical”. Foi através desse conjunto cultural que a ocupação da Amazônia se diversificou. Daí consorcia-se com a vasta biodiversidade originada pela coalescência, junção, dos vários fragmentos (redutos) florestais num único contínuo fitogeográfico: as Florestas Amazônicas, que, ao mesmo passo que dotou os humanos nela já contidos de novos recursos para a subsistência, permitiu com que o processo de colonização europeu fosse literalmente obstruído ao longo dos séculos XVI a XIX. Em outros termos, originou-se aí um relativo “vazio demográfico”.
A Amazônia, por seus pujantes desafios, atraiu alguns aventureiros europeus, que em busca de riquezas minerais (em especial o ouro), os quais iniciaram pequenos núcleos de habitação ao longo de rios. Eles eram motivados pelas lendas do Eldorado e do lago Parrima, que supostamente estariam ligados a uma utópica “fonte da juventude”.
Foi com esta visão de riqueza que incitou os europeus para a expansão territorial pelos Domínios Amazônicos. Durante muito tempo, as duas potências da época, Espanha e Portugal, obedeciam à divisão territorial estabelecida pelo Tratado de Tordesilhas, o qual designava que a maior parte do que hoje se conhece como Amazônia Legal pertencia aos espanhóis. Entretanto, mesmo com seus direitos garantidos, os espanhóis não se preocuparam em povoar a Amazônia e a mesma começou a sofrer ameaça de invasão por outras expedições tais como as inglesas, as francesas e as holandesas.
O processo de formação territorial da Amazônia e da sua ocupação, na visão de Becker (2007, p. 23), dá-se da seguinte forma:
Formação Territorial (1616 – 1930):
- Apropriação do Território (1616-1777);
- Delineamento da Amazônia (1850-1899);
- Definição do Limites (1899-1930).
- Início do Planejamento (1930-1966);
- Produção do Espaço Estatal (1966-1985);
- A fronteira socioambiental (1985-1996);
- Tendências Atuais (desde 1996)
De acordo ainda com Becker (2007), a Região Amazônica teve como base econômica primordial a exportação das “drogas do sertão”, permitindo a delimitação dos limites territoriais da Amazônia Brasileira entre as décadas de 1870 e 1910, mais teve a formação territorial concretizada com a definição e efetivação dos limites da Região entre 1899 e 1930.
A região Amazônia teve um processo lento e gradativo em sua ocupação, assim, vale ressaltar que diante de fatos históricos pesquisados é notório que a ocupação do espaço Amazônico ocorreu por fases, as quais, segundo Picoli (2006), ocorreram durante este processo de ocupação. E a Amazônia “ofereceu” seus produtos naturais para satisfazer as necessidades dos “desbravadores”, que apresentavam como principal objetivo satisfazer o mercado externo (BECKER, 1988).
Por conseguinte, por um longo período (até início do século XX) a Região Amazônica foi considerada um “vazio demográfico” a ser preenchido, o qual necessitava de gente para habitar. Entretanto, quando se falava em “vazio” não se mencionava as centenas de milhares de amazônidas (povos nativos da região, como indígenas e ribeirinhos), que nunca foram considerados como população pioneira, apenas eram taxados de “povo da Floresta”.
Essa falácia, para Gonçalves (2005), era considerada ideologicamente pelo desejo de manutenção da visão ainda colonialista de que a Amazônia deveria ser conquistada como se fosse um território desprovido de gente. Para muitos, ela era desprovida de povos que detivessem conhecimentos estratégicos de subsistência e de práticas sociais, formando culturas muito complexas e antropologicamente fortes e marcantes.
Esse mesmo autor diz que qualquer um dos pesquisadores sabe o quanto suas teses que foram desenvolvidas dependeram e muitas vezes dependem do saber das populações indígenas, é estes saberes que deve ser considerado um dos primeiro recursos que a Amazônia dispõe. Infelizmente, só a partir da década de 1970 que os amazônidas passaram a ser respeitados (mesmo que em parte) por outros segmentos sociais, como os acadêmicos das áreas de Antropologia, Psicologia Social, Ecologia, Etnobotânica, dentre outras.
A Amazônia foi descoberta pela Espanha, conquistada pelos Portugueses mais antes desta conquista oficial, muitos outros também fizeram suas tentativas de conquista tais como; holandeses, franceses, ingleses e europeus, onde os europeus tiveram uma presença bem expressiva na Região Amazônica, que de acordo com Becker (1988), a Amazônia Legal Brasileira vem sendo, ao longo das últimas décadas (mas com raízes colonialistas no século XVI), cobiçada internacionalmente, em especial pelas suas riquezas naturais e potencialidades econômicas. Desta forma,
o mundo volta-se para Região Amazônica, sendo esta terra cobiçada desde o século XVI com objetivo de usufruir dos seus recursos naturais, os europeus foram os primeiros a entrar em contato com o antigo e legitimo povo da floresta (PICOLI, 2006, p. 21).
A Amazônia sempre foi e é palco de interesses e disputa pelos seus recursos naturais, primeiro veio o surto das “drogas do sertão”. Dentre os ciclos econômicos vivenciados na Região Amazônica, o da borracha presumivelmente foi um dos que atraiu maior contingente populacional, com mais de 300 mil nordestinos (PICOLI, 2006), principalmente do sertão do Ceará, migraram para a Amazônia com promessas de riquezas. Assim,
nessa dinâmica do capitalismo de expansão, o Brasil, por possuir a maior reserva mundial através do Extrativismo. Há notícias de que os povos originários tinham amplo conhecimento das propriedades da borracha já em 1720. Os índios da Amazônia já conheciam a elasticidade da borracha (...). Através do aprendizado com os povos da floresta [assim, era a forma que se chamavam os nativos], a Amazônia Brasileira projetou-se ao mercado mundial de forma mais acentuada a partir do ciclo da borracha. Esse produto amazônico, monoextrativista, teve aumentada sua produção a partir de 1870, estendendo-se (...) até 1912. No mais acentuado período extrativista, a selva Amazônica foi invadida por legiões de nordestinos, flagelados da seca (PICOLI, 2006, p. 26-27).
No que concerne à devastação da floresta, percebe-se que esse processo já teve seus reflexos em séculos passados, em especial no Estado do Maranhão, onde as extensões florestais devastadas foram dando origem a Matas e Cocais, com babaçuais extensivos, e capoeiras em estágios diferentes de sucessão ecológica.
À medida que o homem foi descobrindo novas formas alimentares, o espaço a ser utilizado para as plantações ou mesmo para a criação de animais aumentava e grandes áreas de florestas nativas iam sendo derrubadas e substituídas pelas pastagens e/ou lavouras, em grande e pequena escala espacial, respectivamente. Dessa forma, a pecuária foi responsável por cerca de 80% de toda área desmatada na Amazônia Legal Brasileira (PICOLI, 2006).
Enquanto os incentivos fiscais à pecuária diminuíram nos últimos anos, adaptações tecnológicas e gerenciais a condições geoecológicas em áreas como a fronteira “consolidada” da Amazônia Oriental têm permitido um aumento da produtividade e a redução de custos. Os principais agentes do desmatamento para a implantação de pastagens são grandes e médios pecuaristas. Entretanto, existe um elevado número de agentes intermediários, geralmente com baixos custos de oportunidade, que antecipam estes pecuaristas, e que são responsáveis de forma direta por grande parte dos desmatamentos. A expansão da pecuária na Amazônia tem se beneficiado da disponibilidade de terras baratas e, em diversos casos, pela falta de cumprimento da legislação ambiental e trabalhista (BECKER, 2007; FRANKLIN, 2008; DIAS, 2006).
Com a idéia de que a Região Amazônica era um imenso “espaço vazio”, é dado a grupos de empresários o apoio de abertura de suas empresas, com o fim de atrair pessoas para ocupar a região e com isso promover o desenvolvimento econômico. Segundo Picoli (2006 p. 36), por meio da estratégia elaborada por interesses além-pátria, o Estado brasileiro passou a beneficiar os grandes projetos econômicos.
Os grandes projetos instalados na Região Amazônica tinham como objetivo primordial a acumulação do capital, entretanto, para gerar este excedente foi necessário atrair pessoas para trabalhar nas empresas, o que também foi uma forma de povoar a Região Amazônica. Os grupos econômicos detinham todo poder de manipulação dos recursos naturais que Gonçalves (2006) afirma que com todo poder que detinham, as empresas faziam à retirada das árvores, com ou sem plano de manejo, sem qualquer tipo de planejamento adequando e as áreas devastadas não eram reaproveitada de forma que visassem à conservação ambiental. Dessa forma,
as indústrias de transformação de madeira entram primeiro para depois se formar a agropecuária na região, já que as madeireiras objetivam apenas a retirada dos recursos florestais e fazem o aproveitamento econômico das arvores. O processo de retirada das árvores obedece apenas a lógica da produção: abastecer as industrias de transformação de madeiras com a finalidade de fornecer matéria prima com fins econômicos e abastecer os mercados interno e externo. (PICOLI, 2006, p. 141)
Tal processo presente nessa citação não é diferente do que aconteceu nas últimas quatro décadas na Amazônia Legal Maranhense. Ademais, os incentivos fiscais dados às empresas objetivavam os lucros gerados pelas mesmas viessem a contribuir com o crescimento econômico da região. Porém, esses ganhos não eram investidos em prol da região e, sim, em beneficio dos próprios donos e acionistas de empresas. Assim,
através da política de colonização e da necessidade capitalista em colocar a Amazônia no mercado mundial, o Estado cria mecanismos de estímulo à acumulação privada, através dos incentivos fiscais que se efetivou a transferência dos grupos econômicos para a região, pois este era o diferencial para facilitar a acumulação (PICOLI, 2006, p. 36-37).
Para controlar o capital da Região Amazônica, o Governo criou órgãos que serviam como base para incentivar a ocupação, em que as funções específicas eram: ampliar as redes de transportes e comunicação, ordenar o povoamento, incentivar a agricultura e pecuária dentre outras (BECKER, 2007). Vale ressaltar que todos estes incentivos fiscais que foram concedidos à Amazônia Legal Brasileira não beneficiou os pequenos agricultores, apenas os grandes detentores do poder econômico.
Para Becker (2007), isso significa que, enquanto espaço geográfico, territorial, a valorização estratégica da Amazônia originaria novos significados de um duplo patrimônio: o de terras propriamente ditas e o de um imenso capital natural “passível” de usufruto. É visando esse capital natural que a região, ao longo dos tempos, vem sofrendo pressão e alteração na sua configuração natural. Grandes pecuaristas são instalados em espaços desflorestados para desenvolver seus empreendimentos, os quais deixam os solos suscetíveis a qualquer tipo de agentes intempérico-erosivos, gerando ravinamentos, voçorocas e assoreamento dos cursos d’água.
REFERÊNCIAS
AB’SÁBER, Aziz Nacib. Os domínios de natureza no Brasil: potencialidades paisagísticas. São Paulo: Ateliê Editorial, 2003. 159 p.
_______. Amazônia: do discurso à práxis. 2.ed. São Paulo: EDUSP, 2004.
_______. Bases conceptuais e papel do conhecimento na previsão de impactos. In: MÜLLER-PLANTENBERG, Clarita; AB’SÁBER, Aziz Nacib (orgs.). Previsão de impactos: o estudo de impacto ambiental no Leste, Oeste e Sul. Experiências no Brasil, Rússia e Alemanha. 2. ed. São Paulo: EDUSP, 2006a. p. 27-49.
BECKER, Bertha K. Amazônia. Rio de Janeiro: Ática, 1988.
_______. Amazônia: geopolítica na virada do III milênio. 2.ed. Rio de Janeiro: Garamond, 2007.
DIAS, Luiz Jorge Bezerra. Proposta metodológica de zoneamento ambiental aplicada ao município de Anajatuba (MA). 2006. 133 f. Dissertação (Mestrado em Sustentabilidade de Ecossistemas). Universidade Federal do Maranhão, São Luís, 2006.
FRANKLIN, Adalberto. Apontamentos e fontes para a história econômica de Imperatriz. Imperatriz: Ética, 2008.
GONÇALVES, Carlos Walter Porto. Amazônia, Amazônias. 2. ed. São Paulo: Expressão Popular, 2006.
PICOLI, Fiorelo. O capital e a devastação da Amazônia. São Paulo: Expressão Popular, 2006.
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