terça-feira, 24 de março de 2009

O DIAGNÓSTICO COMO SUBSÍDIO À EDUCAÇÃO AMBIENTAL: O CASO DA VILA CONCEIÇÃO, ZONA RURAL DE IMPERATRIZ (MA)

Prof. Luiz Jorge B. Dias
Geógrafo - MSc. Sustentabilidade de Ecossistemas
Professor de Geografia Física - UEMA\CESI\DHG
1. INTRODUÇÃO


Na dinâmica habitual do DPCA (Departamento de Preservação e Conservação Ambiental) da SEMA-MA (Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Recursos Naturais), uma das atividades de maior importância é a identificação de novas áreas sujeitas a serem transformadas em Unidades de Conservação, bem como identificar estratégias de/para manutenção da biodiversidade local e regional. A essas linhas de trabalho, soma-se a necessidade de desenvolvimento de estratégias com bases sustentáveis para salvaguardar o patrimônio biodiverso presente em áreas de preservação permanentes (APP’s).

Convidado pelo Deputado Estadual Valdinar Barros (PT-MA), o geógrafo e Consultor Sênior da SEMA-MA, Prof. MSc. Luiz Jorge B. Dias, visitou em agosto de 2008 o assentamento Vila Conceição, situado a aproximadamente 32 km da sede do município de Imperatriz e que, em sua história de mais de 20 anos de ocupação, muitas atividades já foram desenvolvidas pelos moradores que alteraram significativamente algumas estruturas e alguns sistemas ambientais locais.

A justificativa daquela vistoria reside no fato de haver grande necessidade e motivação por parte da comunidade de resgatar o patrimônio ambiental perdido pelas sucessivas intervenções danosas ao meio que aconteceram nas últimas duas décadas, uma vez que é apresentada a estratégica situação geográfica daquele espaço para pleitear a criação de uma Unidade de Conservação Estadual (UC) do Grupo de Uso Sustentável.


2. CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA


Neste item serão apresentados resumidamente as principais características ambientais da Vila Conceição, enfatizando as relações ambientais entre os componentes físicos, ecológicos e humanos locais. Tais considerações são consideradas indispensáveis, pois proporcionam o reconhecimento dos elementos naturais e sociais, de forma integral, que devem ser inseridos dentro da discussão sobre as alternativas de reversão de danos ambientais na localidade.


2.1. Geologia, Geomorfologia e Solos


A Geologia e a Geomorfologia locais são as bases para o reconhecimento de todas as formas de processos ambientais desenvolvidos dentro de qualquer parcela da superfície da Terra. No caso da Vila Conceição, isto não difere. A primeira apresenta o reconhecimento das bases evolutivas das rochas e dos terrenos que a compõem, apresentando, muitas vezes, possibilidades de aproveitamento econômico dos espaços disponíveis e estudados.

Nesse sentido, o sítio locacional da Vila Conceição está situado sobre rochas da Formação Itapecuru, de idade cretácea (ou seja, de mais ou menos 100 milhões de anos), com grande concentração de arenitos e argilitos e manifestação de núcleos de rochas com grande concentração de minério de ferro. Associada a essa formação, destacam-se as coberturas detrítico-lateríticas quaternárias, formada por depósitos locais de areias de granulometria fina, argilas, grandes concentrações de matéria orgânica decomposta, apresentando depósitos de húmus (terra preta). A esses aspectos, somam-se a presença de alguns pontos de concreções ferruginosas do tipo laterita, que servem para a construção civil, na confecção dos alicerces das casas.

Já a Geomorfologia apresenta as variações dos altos e baixos da superfície da Terra e é responsável por compreender a evolução e os processos relacionados às formas de relevo. A altitude média do relevo do assentamento Vila Nova Conceição está no patamar de ± 170 metros acima do nível do mar. Entretanto a sua altitude mínima está na casa dos 150 metros e máxima na faixa dos 220 metros.

O relevo local é formado por três feições, em especial:
- Planícies de inundação associadas a rios locais, tributários do Tocantins e compostas por grande concentração de material orgânico em decomposição, associados a areias finas e argilas;
- Patamares intermediários semi-colinosos, onde estão situadas a maior parte das casas, tanto na Vila Conceição I, quanto na Vila Conceição II. Configuram-se como pequenos morros de declividades suaves, apresentado pequenas ladeiras locais;
- Patamares dissecados associados à ramificação da Serra do Gurupi, que, situado próximo à BR-010, apresenta configuração de relevo com altimetria mais elevada e grande concentração de lateritas e de solos sujeitos a processos erosivos mais intensos. São os principais fornecedores de sedimentos para os dois outros patamares de relevo.

Quanto aos solos locais, são identificados três, em especial: a) latossolos amarelos, bem drenados e ainda capeados por vegetação de capoeira; b) gleissolos, associados a ambientes semi-úmidos, como as planícies de inundação; c) solos hidromórficos indiscriminados, associados às áreas permanentemente inundadas (APP’s).

O primeiro é mais sujeito à erosão e causador de assoreamento dos cursos d’água locais, como o Riacho da Lagoa. O segundo apresenta a possibilidade de retenção de sedimentos provenientes de lugares mais elevados, mas pela baixa densidade de cobertura vegetal, acaba por proporcionar a passagem de sedimentos/detritos para áreas mais baixas, assoreando, também, os corpos hídricos. O último é uma variação dos gleissolos, mas estão sujeitos à expansão de suas áreas, uma vez que os riachos tornam-se menos profundos e as margens passam a ser erodidas e tomadas pelas cheias de forma mais crítica durante os períodos chuvosos.

2.2. Cobertura Vegetal

No espaço total da Vila Conceição, são encontradas as seguintes coberturas vegetais predominantes:
- Vegetação amazônica remanescente, em áreas que se apresentam como pequenas “ilhas” de biodiversidade, em especial associada a vertentes de patamares dissecados;
- Capoeira fina, desenvolvida em áreas outrora destinadas a pastagens e cuja diversidade biológica é baixa, já que existe grande seletividade de plantas para o seu desenvolvimento ótimo;
- Capoeira média, que demonstra processo de sucessão ecológica em estágio de recomposição otimizado, já com inserção positiva de fauna associada;
- Capoeirão, que é a formação vegetal em estágio de clímax, uma vez que atingiu seu grau máximo de recomposição e sua configuração paisagística assemelha-se a uma formação vegetal próxima ao original;
- Matas beiradeiras (ou ciliares), assim denominadas por protegerem as margens de cursos d’água dos processos de sedimentação acelerados (assoreamentos indiretos induzidos). São grandes corredores de biodiversidade e funcionam como reguladores climáticas e hidrológicas locais e regionais;
- Mata dos Cocais, um tipo especial de capoeira onde a cobertura vegetal é dominada pela presença da palmeira de babaçu (Orbygnia ssp.), que é extensivamente utilizada para fins econômicos.

2.3. Ocupação Humana

Com 4.795,5721 hectares de área total, o assentamento Vila Conceição (tanto a I, quanto a II) nos últimos anos passam por grandes e positivas alterações em suas dinâmicas e estruturas espaciais. Com a construção de pontes, financiamentos agrícolas, melhorias nos sistema educacional (com a implementação de uma escola de nível fundamental), e melhorias no acesso (6 km de estrada), o assentamento se insere em uma nova lógica produtiva, proporcionando mudanças significativas nas dinâmicas cotidianas locais.

Ambos os espaços (Vila Conceição I e II) são compostos por casas de alvenaria e telhas coloniais ou de “brasilit”, com sistema de poço artesiano que abastece a toda a população de forma segura, com água de boa qualidade. A instalação do projeto de capeamento das ruas do assentamento levou aos moradores uma alternativa diferenciada de trabalho e renda: a instalação de uma pequena fábrica de “bloquetes”, que são utilizados para as melhorias nos arruamentos, aproveitando duplamente a mão-de-obra local.

3. NECESSIDADES DE INTERVENÇÕES E IMPACTOS RELACIONADOS

Sabe-se que em todos e quaisquer espaços ocupados pelo homem são desenvolvidas alterações nos sistemas ambientais de forma expressiva. A dinâmica de modificações das paisagens é responsável pela redistribuição de componentes bióticos e físicos regionais, o que implica em tendências de uso e ocupação diferenciadas ao longo do tempo.

Os principais problemas ambientais observados no assentamento aqui trabalhado são:
- Processos erosivos e assoreamento de cursos d’água: dano ambiental de grande expressividade local. Sua dinâmica está relacionada à retirada da cobertura vegetal que proporciona a remoção, pelos agentes meteorológicos, dos sedimentos que compõem a estrutura superficial da paisagem. Estes, por seu turno, passam pelo processo de carreamento detrítico e posterior deposição do material em níveis de base locais, como são os casos dos corpos hídricos;
- Produção de lixo e deposição inadequada: problema ambiental comum a todos os assentamentos humanos, não difere em substância e relevância no assentamento Vila Conceição. Há diversos tipos de materiais usados depositados livremente em ambientes, tais como cursos d’água, APP’s, cabeceiras de drenagem e áreas de capoeira fina;
- Desperdício de água potável: como o item anterior, este também é um dano ambiental comum a todos os assentamentos humanos. A utilização de água potável para fins não-nobres possibilita, aos poucos, o esgotamento da disponibilidade hídrica subsuperficial para o abastecimento da população, como já ocorreu antes no próprio assentamento, demandando a perfuração de poços mais profundos;
- Presença de plantas invasoras em cursos d’água: problema ambiental derivado do assoreamento do Riacho da Lagoa, em área total de 70 m X 50 m (3.500 m2), que foi ocupado rapidamente por capim navalha (Hypolytrum pungens), o que acabou por proporcionar supressão de um importante espaço de lazer da população.


4.ORIENTAÇÕES BÁSICAS AOS TOMADORES DE DECISÃO: Considerações Finais

Considerando os principais problemas ambientais existentes no assentamento Vila Conceição I e II, no município de Imperatriz (MA), apresentam-se aos tomadores de decisão algumas propostas de solução ou mitigação de danos ambientais, conforme segue:
- Quanto aos processos de erosão e assoreamento de cursos d’água, é fundamental que seja desenvolvido um projeto de recuperação e recomposição florestal, com a instalação de canteiros de produção de mudas de espécies vegetais nativas, tanto para o florestamento das APP’s, como para a reintrodução de essências nativas em áreas de terra firme. Para tal, é indispensável que sejam formatadas parcerias entre a comunidade, o Sindicato dos Trabalhadores Rurais ao qual ela está ligada, com a Secretaria de Agricultura do Estado do Maranhão (SEAGRO-MA) e SEMA-MA. Ademais, o Departamento de Ciências e o Curso de Agronomia da Universidade Estadual do Maranhão / Centro de Estudos Superiores de Imperatriz (UEMA/CESI) podem fornecer informações complementares sobre as espécies que devem ter mudas produzidas, bem como quais são as estratégias de florestamento mais adequadas dentro do espaço total em questão. O Departamento de História e Geografia da mesma Universidade também poderá contribuir no processo, desenvolvendo trabalhos de reconhecimento dos principais núcleos espaciais para a instalação dos programas-piloto de reinserção de espécies nativas;
- Há grande necessidade de desenvolvimento de cursos de capacitação em educação ambiental voltados para a comunidade local. Esse trabalho deve primar pela sensibilização comunitária e deve envolver parcela significativa da população local residente. Os trabalhos devem estar centrados na conceituação de problemas ambientais; impactos e degradações; uso e ocupação dos espaços disponíveis; legislação ambiental; a questão do lixo e problemas derivados; uso e gestão dos recursos hídricos; mudanças climáticas; e participação das comunidades locais nas tomadas de decisão de cunho ambiental. Essa atividade deve ser desenvolvida em conjunto com a SEMA-MA, mediante pedido formal (via ofício) elaborado pela associação de moradores e protocolado junto à SEMA-MA, solicitando o desenvolvimento do “Curso de Formação de Agentes Ambientais Voluntários”. O Documento deverá ser destinado diretamente ao Secretário de Estado;
- Quanto à invasão de espécie invasora em corpo d’água (o caso do “capim-navalha” no Riacho da Lagoa), é imprescindível afirmar que o mesmo somente se instalou perto do “sangraduro” pelo fato de ali ter se desenvolvido um núcleo intenso de assoreamento, que possibilitou a instalação daquela espécie. Entretanto, com a instalação de formação vegetal tão homogênea há possibilidade de a mesma, pela sua disposição espacial e formação radicular (raízes), proporcionar maior assoreamento do ambiente hídrico em si, criando, então, um ciclo ambientalmente vicioso. Sugere-se à comunidade solicitar formalmente ao Secretário de Estado de Meio Ambiente e Recursos Naturais a retirada da formação vegetal invasora, que pode ser desenvolvia pela própria população local. Essa “limpeza de terreno” não está em APP e é uma resposta adversa às ocupações e usos indiscriminados dos espaços disponíveis, o que implicará, gradativamente, numa ruptura substancial dos sistemas ambientais associados aos cursos d’água locais. Afirma-se que caso isso não seja feito em tempo hábil (menos de 03 meses), o capim-navalha se proliferará por espaço consideravelmente maior concomitantemente ao período chuvoso, dispersando-se em direção à jusante (“rio abaixo”), o que acarretará em problemas regionais exponenciais, no que tange à Bacia do Riacho da Lagoa.

Essas providências são consideradas básicas para a resolução dos problemas ambientais do assentamento Vila Conceição I e II. É conveniente afirmar que as propostas ora apresentadas devem ser desenvolvidas num prazo máximo de 01 ano, a contar da apresentação formal deste Documento, já que se considera indispensável que os efeitos das tentativas de mitigação de danos ambientais e de comportamentos sociais sejam revistos em outubro do próximo ano por técnicos desta SEMA-MA.

Por fim, é relevante e marcante paisagisticamente os componentes naturais e de cobertura vegetal presentes no entorno dos assentamentos humanos. Isso proporciona a possibilidade desse espaço de pleitear a possibilidade de se transformar em uma Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) Estadual, uma Unidade de Conservação do Grupo de Uso Sustentável, definido por lei específica (Lei Federal Nº. 9985/2000).

Para tal, faz-se necessária a assinatura de um protocolo de intenções entre o Governo do Estado do Maranhão, a Assembléia Legislativa do Estado do Maranhão, a SEMA-MA, a SEAGRO, FAPEMA e a UEMA/CESI. À penúltima instituição cabe o fornecimento de bolsas de pesquisa para que os pesquisadores da UEMA/CESI desenvolvam ações estratégicas de reconhecimento dos elementos físicos, bióticos e socioeconômicos regionais, bem cmo delimitação do espaço total a ser considerado como com a finalidade de montar uma base de dados e um conseqüente relatório que subsidie tecnicamente à SEMA-MA avaliar as possibilidades de transformação legal dessa área em uma RDS, bem como apresentar estratégias de governabilidade ambiental mais assertiva na Região Tocantina Maranhense.

Um comentário:

  1. Olá professor Luis Jorge, seu blog está muito bom. Peço-lhe que se for possível mande esse seu último texto para o meu e-mail, pois preciso de algo parecido para servir de referência quanto trabalho parecido que estou desenvolvendo.

    abraços
    Sávio J. D. Rodrigues
    saviodiasbr@hotmail.com

    ResponderExcluir