Em Geografia, fronteira é todo e qualquer limite entre duas ou mais
nações. Em outros termos, sua essência analítica está voltada para a
compreensão geopolítica de zonas de possíveis conflitos de poder, que podem se
materializar em estratégias de ocupação, investigação, monitoramento e controle
de atividades, numa espécie de processo de imposição de “respeito” aos países
vizinhos, conhecido como soberania
nacional. Quando se trabalha conceitualmente com o termo limites, quer-se fazer menção a todos e
quaisquer traços físicos e/ou imaginários que dividem duas ou mais áreas e que
é mais usual quando se refere a espaços e suas divisas dentro de um mesmo país,
de uma mesma nação.
Entretanto, essas concepções clássicas têm apresentado novas
caracterizações, em função dos avanços concepto-pragmáticos alcançados a partir
de meados a fins do século XX. O conceito econômico de fronteira passou a ser mais bem discutido e empregado na Geografia
a partir da indicação do termo Zona
Pioneira. Foi Waibel (1979) o responsável pela concepção dessa terminologia
bastante prática. O mencionado autor afirma que os europeus concebiam o termo fronteira como um puro limite entre
nações, como foi mencionado anteriormente neste trabalho. Entretanto, em outros
países, como nos Estados Unidos, tal denominação passou a ter uma conotação
econômica, configurando os limites das áreas de povoamento. Assim,
enquanto a fronteira como limite político representa uma linha
nitidamente demarcada, a fronteira no sentido econômico é uma zona, mais ou
menos larga, que se intercala entre a mata virgem e a região civilizada. A esta zona damos o nome de
zona pioneira (WAIBEL, 1979, p. 281 – grifo nosso).
Nessa citação, a palavra civilizada foi assinalada, tendo em vista a
explícita necessidade de reorganização conceitual. Ao se falar de civilização o autor queria mencionar área povoada. Assim sendo, o conceito de
Frente Pioneira apresenta um território passível de ocupação, cuja configuração
espacial está em função de suas características físicas e ecológicas, de um
lado, e das formas de usos, mais ou menos homogêneas, materializadas pelas
questões histórico-sociais e as atividades econômicas (atuais e pretéritas).
As questões econômicas são tão marcantes nesse tipo de análise espacial
que Trovão (1989) destaca, no contexto maranhense, que as fronteiras (ou zonas
pioneiras) são uma clara formatação dos sucessivos avanços sociais por áreas
ainda não habitadas suficientemente e que, por isso, podem ajudar a dar vazão
às idéias de desenvolvimento de “válvulas de escape” sociais, a partir de zonas
de conflitos. Assim, as fronteiras econômicas tendem a se deslocar para
qualquer lugar onde existam, existiam ou se presume existir terras
disponíveis ou devolutas que possam ser utilizadas como reserva de capital.
Portanto, fronteira [...] e capital são dois fatores que estão interligados,
uma vez que tanto um quanto o outro visam à ocupação e a posse da terra. Em
virtude disso, os destinos de uma fronteira estão relacionados diretamente com
o processo de ocupação da terra (TROVÃO, 1989, p. 80).
Becker (2007, p. 20) afirma que fronteira
deve ser compreendida como “[...] um espaço não plenamente estruturado e, por
isso mesmo, potencialmente gerador de realidades novas [...]”. Por isso mesmo,
elas podem coexistir, dependendo das suas atividades econômicas
contextualizadas num mesmo território. Por exemplo, há no Estado do Maranhão,
como será visto ainda neste trabalho, devido às dinâmicas socioeconômicas dos
últimos 30 anos no contexto da faixa Ocidental Maranhense, coexistência de atividades
madeireiras e suas fronteiras de devastação consorciadas com o avanço da agropecuária
e da instalação de espaços urbanos densificados e de planejamento inexistente.
Ademais, as fronteiras devem ser compreendidas como um componente
especial dentro de um território passível de múltiplas transformações, dada à
intensa dinâmica econômica e suas implicações sociais e culturais,
considerando, na atualidade, os problemas ambientais decorrentes de processos
históricos de usos indevidos (leia-se: não planejados) de ocupação espacial e
de utilização dos recursos naturais.
Pode-se enquadrar como fatores de consolidação de fronteiras econômicas
ou zonas pioneiras os seguintes processos/fatores:
a)
presença de
áreas passíveis de ocupação, dotadas de recursos naturais ou humanos
indispensáveis à sustentação de atividades econômicas no médio e longo prazos;
b)
conectividade,
que representa a possibilidade de ocupação espacial e uso dos recursos, tendo
em vista as necessidades de insumos para a produção ou captação de
matérias-prima e a sua conseqüente comercialização, como também a de seus
produtos derivados. Em outros termos, o não-isolamento é um pré-requisito para
que as fronteiras econômicas sejam materializadas;
c)
grupos
populacionais humanos sujeitos a viverem, por determinado tempo, em condições
insalubres, tendo em vista a falta de estruturas e serviços básicos de primeira
necessidade por um lado (como escolas, hospitais, centros comerciais, bancos,
estradas de ferro ou de rodagem, dentre outros) e de outro a realização da
necessidade de ocupação de espaços onde eles possam desenvolver suas atividades
econômicas de subsistência e/ou de mercado;
d)
incentivos
políticos para a ocupação “pioneira”, que pode ser demonstrada tanto por
indicações legais, como em políticas públicas de ocupação de áreas despovoadas,
como nos casos históricos de desatenção que o Estado manifesta para certas
áreas, criando “vazios” de ações governamentais, o que concorre para o
acirramento de conflitos de uso e ocupação, bem como para a instauração de
“poderes paralelos” que dificultam a instalação posterior de estratégias de
planejamento para correção ou mitigação de processos históricos adversos;
e)
momento
histórico, que orienta quais são as demandas de matérias-prima e produtos,
tanto a nível regional, quanto nacional e internacional, o que concorre para
formatação de uma zona de produção em função de um mercado consumidor.
A soma desses fatores origina, di
per si, não apenas as zonas pioneiras, mas um conjunto de processos sociais
que, se não assistidos de perto pelos entes governamentais (municípios, estados
e União), em suas três esferas de Poder (Executivo, Legislativo e Judiciario),
acabam por construir territorialidades cujas atividades econômicas podem ser as
mais diversas, porém podem desencadear posturas socioculturais muitas vezes
degradante, em que os direitos básicos do cidadão são tolhidos ou colocados à
prova. Daí a importância desse tipo de estudo.
REFERÊNCIAS
BECKER, Bertha K. Amazônia: geopolítica na virada do III milênio. Rio de Janeiro:
Garamond, 2007. 172 p.
TROVÃO, José Ribamar. Ilha latifundiária na Amazônia Maranhense: estudo da expansão da fronteira
agrícola no Médio Vale do Pindaré – o caso de Santa Inês. São Luís:
UFMA\PPPG, 1989. 220 p.
WAIBEL, Leo. Capítulos
de Geografia Tropical e do Brasil. 2. ed. Rio de Janeiro: IBGE, 1979. 326
p.