quarta-feira, 31 de março de 2010

Formação Territorial Brasileira: As Bases das Ciências Humanas e Sociais do País

Prof. MSc. Luiz Jorge B. Dias
Geógrafo - Mestre em Sustentabilidade de Ecossistemas
Prof. Auxiliar I de Geografia Física - UEMA\CESI\DHG
Na atualidade, muito se tem especulado sobre a necessidade de reconhecimento das tipologias de espaços geográficos como subsídio técnico e científico para o planejamento territorial. Na verdade, esse tipo de informação é considerado essencial para a consolidação de investimentos, tal como a sua indicação de inviabilidade.

Historicamente, as relações entre homem e meio têm se desenvolvido de forma a gerar conflitos de uso e de ocupação. Desde o início do processo de colonização européia no Brasil, o reconhecimento das potencialidades econômicas que o território pré-brasileiro poderia oferecer foi considerado de forma absolutamente salutar para:
a) ocupação dos espaços disponíveis;
b) exploração de recursos naturais;
c) geração de lucros a partir da instalação de cadeias produtivas locais baseadas no cultivo de produtos de primeira necessidade (à época), com vistas ao mercado internacional.

Assim, os esforços de reconhecimento do território da “Colônia” (tanto na zona costeira, quanto no interior) foram quase que paralelamente sendo acompanhados por esforços de povoamento e exploração. Esta, por seu turno, era voltada tanto para a subsistência dos “colonos”[1], quanto para a manutenção dos desejos do mercado europeu.

Os conflitos pelas terras gerados pelos esforços de ocupação e exploração econômica empreendido por iniciativa portuguesa a partir do século XVI tiveram nos indígenas as suas primeiras materializações. Longe de ser pacífica, a relação conflituosa e desigual entre colonizador e colonizado acabou por elaborar um quadro social de exclusões e compensações, tudo em função de modus operandi diferenciados. Os massacres das sociedades nativas a partir do litoral ou sua conseqüente “expulsão” desse tipo de ambiente forçou a ambos os conjuntos de “agentes sociais” a repensarem seus processos de ocupação. Daí surgem as primeiras fronteiras, que antes de serem econômicas, já eram de natureza social.
Destarte, as ocupações, restritas ao conjunto de espaços costeiros da Faixada Atlântica Sul-Americana até os fins do século XVI, vertem-se para o reconhecimento de outros espaços, mais interiorizados e, por isso mesmo, absolutamente passíveis de neles serem encontrados novos recursos que gerariam novas “fronteiras”. É nesse sentido que são desenvolvidas as “Entradas” e “Bandeiras” e o desvendamento das potencialidades dos “sertões” a partir de múltiplos espaços adjacentes ao litoral, seja seguindo cursos de rios, seja acompanhando traçados de relevos diferenciados, seja simplesmente seguindo espaços vastos de planícies inundáveis, que seriam denominadas de bajadas, ou seja, baixadas.
A história da construção territorial, a partir de então, segue a partir do binômio reconhecimento do território e desenvolvimento de atividades econômicas. As explorações econômicas do território originaram correntes de povoamento e correntes de povoamento geraram explorações econômicas do território. Isso se fez presente nos séculos posteriores, em que pesem as características de “marchas para o Oeste” que se pautaram no Brasil em diferentes períodos, do século XVII ao século XX. Embora houvesse, para cada período, conjunturas tecnológicas, sociais, econômicas e políticas heterogêneas, os esforços de compreensão das potencialidades territoriais sempre estiveram ligados à necessidade de expansão e fronteiras, tanto políticas, quanto econômicas, o que permitiu e (continua permitindo) a dominação dos espaços disponíveis.
Por fim, é impossível desenvolver quaisquer que sejam os esforços para planejar e ordenar territórios no Brasil sem considerar o elemento-binômio "formação e constituição espacial". Dessa maneira, esse trabalho objetivou, de forma bastante simplificada e resumida, levar ao leitor uma perspectiva de como o espaço brasileiro foi-se constituindo nos últimos séculos e o que isso tem a ver com a história contemporânea nacional. Fatos de grande importância para a compreensão do que é o nosso País.
[1] Ab’Sáber (2003, p. 203) afirma que “[...] a esses modestos povoadores que se multiplicaram pelas solidões das regiões serranas florestais do Brasil Atlântico é que se deve a ocupação efetiva de muitas áreas segregadas, distantes umas das outras, as quais através dos séculos ficaram mais ou menos à margem dos caminhos de circulação mais geral, atirados aos seus próprios recursos e à sua própria sorte, garantindo a sua subsistência à custa de uma produção polimorfa. Na realidade, frente às implicações da segregação e o triste isolamento, tinham que fabricar ou produzir desde a alimentação de que necessitavam, assim como a sua equipagem agrária, sua roupagem grosseira, para não falar das suas modestas habitações caboclas, feitas na maior parte das vezes de troncos de árvores e paus entrelaçados calafetados irregularmente com barro e recoberto de palha seca [...]”.

BREVES NOTAS SOBRE CONCEITOS INDISPENSÁVEIS EM GEOMORFOLOGIA

Prof. MSc. Luiz Jorge B. Dias
Geógrafo - Mestre em Sustentabilidade de Ecossistema
Prof. Auxiliar I de Geografia Física - UEMA\CESI\DHG

A configuração geomorfológica é uma das parcelas mais notáveis do espaço total regional, devendo ser compreendida em função, ao primeiro momento, de sua estruturação litoestratigráfica (conforme os ambientes geológicos onde são encontradas tais formações); e em um segundo momento, de suas porções superficiais, representadas pelas variações pedológicas, coberturas vegetais, condicionantes (elementos) de tempo e clima, hidrografia e distribuição de vertentes e seus respectivos canais de escoamento, áreas de estocagem hídrica, além das antropogêneses.

Estas (as antropogêneses), por seu turno, são compreendidas como os processos de modelagem da superfície da Terra em que pesam as forçantes (condicionantes) das ações humanas como indutoras das mudanças ao longo da estrutura superficial da paisagem (DIAS, 2004). Dessa maneira, as transformações ambientais físicas e ecológicas estão relacionadas à disponibilidade de tecnologias viáveis para a apropriação (ou criação) de novos espaços, quanto pelo desejo de ocupar novas áreas (DIAS et. al., 2005; DIAS, 2006), a fim de se estabelecer novos elementos a serem enquadrados em índices econômicos (valores) de uso e troca de terra ou solo[1] (CASSETI, 1995).
Para Muehe (2002, p. 191), a evolução morfodinâmica é
[...]geralmente o resultado de uma longa interação entre tectonismo, litologia e
clima, [e] pressupõe, para sua compreensão, a reconstituição paleogeográfica da
área considerada. A compreensão desta evolução pode, muitas vezes, fornecer
importantes indicações para a inferência da evolução futura, ou para melhor
avaliar a representatividade de uma tendência evolutiva, observada num curto
espaço de tempo [...].

Portanto, é importante na compreensão dos fatos geomorfológicos, que sejam analisadas as interações entre os elementos endógenos e exógenos, com a finalidade de se analisar as tendências evolutivas das geoformas. Nesse sentido, Ross (2003, p. 26-27) ressalta que os conceitos que melhor fazem compreender o modelado terrestre são os de morfoestrutura e morfoescultura.
O primeiro diz respeito à estrutura mórfica e geológica do terreno, geralmente referenciando-se a embasamentos estruturais (cristalinos e/ou sedimentares). As plataformas, as cadeias orogenéticas (sejam os maciços antigos ou modernos) e as bacias sedimentares (ou seja, áreas de diferentes idades e composições litoestratigráficas) são classificadas como exemplos bem práticos de domínios geológicos (ROSS, 2003). Portanto, nessa perspectiva é impossível estudar o modelado da superfície da Terra sem que haja uma inter-relação concepto-pragmática entre os fatos geomorfológicos e as ações geológicas (morfoestrutura) e climáticas nele atuantes (morfoescultura).
Ross (2001, p. 33-35) destaca que a Terra, geológica e geomorfologicamente, pode ser dividida em vários domínios, denominados de “macroformas estruturais”[2]. Ab’Sáber (2001a) ressalta a necessidade da orientação de estudos integrados à compreensão do que convencionou denominar de megageomorfologia do território brasileiro[3], os quais possuem a finalidade de reconhecimento integrado dos caracteres intrínsecos do modelado terrestre em determinadas porções territoriais, sejam elas de pequenas, médias ou grandes extensões territoriais.
Esse direcionamento metodológico (o da megageomorfologia) é absolutamente importante para o planejamento territorial e deve ser enquadrado na aplicação de instrumentos técnico-científicos como os Zoneamentos Ambientais. Outrossim, ao passo que são conhecidos os fatos geomorfológicos estruturais e esculturais em escalas mais contingentes, fazem-se necessários desenvolvimentos de estudos sobre as realidades regionais (mesoescalares).

Às macroformas estruturais se associam os aspectos esculturais do relevo (a morfoescultura), ou seja, à “disposição” que determinada região (ou província geológica, em função de suas formações e configurações litológicas) tem de ser modelada conforme os domínios climáticos locais ou regionais, gerando formas diferenciadas, em heterogêneas áreas de cobertura climática, isto, obviamente, através do tempo geológico (AB’SÁBER, 1971; BIGARELLA et. al., 2003). O conceito de domínios morfoclimáticos dá ênfase maior a essa concepção analítica, a morfoescultura, já que este trabalha a ação do clima sobre o relevo, seu processo de desgaste, intemperização, erosão e deposição sedimentar. Em outros termos,

[...] o conceito de morfoescultura volta-se, portanto, às feições do relevo
produzidas ma terra pela ação dos climas atuais e pretéritos e que deixam marcas
na superfície do terreno, específicas de cada processo dominante. [...] Isso
significa que sobre uma determinada morfoestrutura pode-se encontrar uma ou mais
unidades morfoesculturais, ou, ao contrário, em duas ou mais unidades
morfoestruturais pode-se encontrar apenas uma unidade morfoescultural [...]
(ROSS, 2003, p. 40).

O processo de morfodinâmica (dinâmica do modelado geomorfológico) de paisagens em função de denudações de terrenos e seus conseqüentes processos de morfogênese (origem das formas) e pedogênese (origem de tipos diferenciados de solos) tendem a ser mais significativos em regiões intertropicais, principalmente úmidas e superúmidas. Contudo, deve-se ressaltar que, para efeitos de uma abordagem compreensiva e integral sobre o modelado em domínios climáticos diferenciados, é imperativa a concatenação analítica de elementos morfoesculturais e morfoestruturais.
[1] Geograficamente, terra se relaciona a espaços ocupados em áreas rurais e solo àqueles utilizados, usufruídos ou ocupados em áreas urbanas (DIAS, 2004).

[2] A divisão da Terra em vários domínios está condicionada às características litoestratigráficas dispostas em unidades territoriais homogêneas.

[3] Para Ab’Sáber (2001a, p. 71), “[...] no caso específico da expressão megageomorfologia existe, acima de tudo, a oportunidade de exercitar a transdisciplinaridade, por meio de uma preocupação de integrar conhecimentos disponíveis de ordem macrorregional, regional ou sub-regional significantes. Trata-se de sintetizar, seletiva e hierarquicamente, os fatos essenciais da geomorfologia de grandes extensões territoriais, com ênfase em áreas de primeira ordem de grandeza espacial. No entanto, como a geomorfologia de um país, por menor que ele seja, depende de vastos envoltórios, é possível realizar estudos megageomorfológicos centrados em espaços territoriais aparentemente de pequena extensão. Mesmo porque para bem conduzir estudos geológicos e geomorfológicos não é possível cingir-se a espaços administrativos nacionais ou provinciais [...]”.

terça-feira, 30 de março de 2010

TEORIA E PRÁTICAS AMBIENTAIS NA BACIA DO BACANGA (SÃO LUÍS – MA)

Prof. MSc. Luiz Jorge B. Dias
Geógrafo - Mestre em Sustentabilidade de Ecossistemas
Prof. Auxiliar I de Geografia Física - UEMA\CESI\DHG
Atualmente, os debates sobre as temáticas ambientais são dos mais difundidos e compartilhados socialmente. Todas as esferas de Poderes Públicos, bem como todas as classes sociais, já se inseriram nas discussões sobre o “futuro do Planeta”. Embora as discussões sejam acaloradas, ainda existe um largo abismo entre teorização e práticas socioambientais.

Não há avanços pragmáticos sem bons conceitos correlacionados. Assim, quando se fala em ambiente, deve-se remeter a todo um conjunto de elementos e sistemas físicos, ecológicos e sociais, compreendidos de forma indissociável. Sem isso em mente, não há como desenvolver quaisquer intervenções orientadas ao ordenamento territorial, tendo em vista a melhoria da qualidade de vida da população.

Nos últimos 20 anos, o Brasil tem evoluído bastante nas concepções e métodos práticos de Avaliação de Impactos Ambientais, sendo um dos maiores produtores desse tipo de conhecimento no mundo. As três principais linhas de atuação prática na identificação e proposição de tecnologias de mitigação de danos ambientais em curso são: 1) identificação dos riscos ambientais físicos, ecológicos e sociais, com propostas de melhoria da qualidade de vida da população; 2) minimização das perturbações ambientais em ecossistemas naturais, agrários e urbanos e; 3) implementação de tecnologias que promovam o desenvolvimento endógeno, ou seja, conciliação do desenvolvimento econômico local, com a conservação da natureza.

Baseados nesses três pilares é que o Programa de Recuperação Ambiental e Melhoria da Qualidade de Vida da Bacia do Bacanga, em seus três componentes, foi desenvolvido pela Prefeitura Municipal de São Luís (PMSL). A concepção de que componentes diversos integrados em um mesmo e real esforço de planejamento territorial é algo inovador no que tange à requalificação urbana, tanto em seus quesitos conceituais, quanto de intervenções práticas. Ao serem coadunados elementos políticos e, sobretudo, técnicos de Gestão Municipal de Desenvolvimento Econômico Local, Água e Saneamento, Urbanização e Meio Ambiente, como o são nesse Programa da Prefeitura Municipal de São Luís, a possibilidade de encarar as melhorias das condições de vida de uma população superior a 260.000 pessoas deixa de ser especulação e se transforma em realidade.

Em especial, no que tange às temáticas ambientais do Programa aqui apresentado, é importante frisar que elas não são apenas elementos acessórios de algo maior. Na verdade, todo esse esforço de planejamento e de intervenções já se configura como uma readequação socioambiental, tendo em vista a diminuição de riscos naturais, de alagamentos, de expansão de vetores de doenças infecto-contagiosas e, principalmente, proteção dos recursos naturais e de seus serviços ambientais, como aclimatação, controle térmico, proteção de áreas de recarga de aqüíferos (compartimentos d’água subterrâneos e estratégicos para a gestão e uso dos recursos hídricos), manutenção da biodiversidade e contenção de impactos ambientais provenientes da zona urbana e que se direcionam para o Parque Estadual do Bacanga.

Por fim, a compreensão dessa totalidade de fatos permite ao Município de São Luís desenvolver um corpo metodológico de políticas públicas voltadas para o desenvolvimento sustentável de sua população, extensível a todas as demais bacias hidrográficas da Capital Maranhense. A compreensão da dinâmica espacial e das problemáticas socioambientais dentro de um mosaico urbano e de unidades de paisagem tão diverso como a Bacia do Bacanga contribui para a implementação correta e coesa de atividades tão necessárias para a materialização do seu ordenamento territorial, com respeito à cidadania.