domingo, 19 de janeiro de 2014

TÓPICOS ESSENCIAIS SOBRE A GEOLOGIA DO ESTADO DO MARANHÃO

Prof. MSc. Luiz Jorge B. Dias
Geógrafo - Mestre em Sustentabilidade de Ecossistemas
Prof. Assistente I de Geografia Física - UEMA\CESI\DHG
luizjorgedias@hotmail.com

A Geologia de uma região é a base material para o desenvolvimento de toda e qualquer atividade humana, bem como se configura como palco para a articulação de todos os processos geoambientais possíveis. Objetivamente, o Maranhão é dotado de duas significativas e importantes estruturas geológicas de idades diferenciadas:

a)    Embasamento Cristalino, composto de rochas de diferentes idades, as quais são superiores a 600 milhões de anos (M.A.). Esse conjunto estrutural é formado petrograficamente por rochas magmáticas intrusivas ou plutônicas (como os granitos, o granodiorito e o gabro) e por rochas metamórficas (como os quartzitos, os migmatitos e os gnaiss);
b)    Bacias Sedimentares, formadas por conjuntos rochosos denominados de fanerozóicos, ou seja, com idades inferiores a 600 M.A., e são compostas de rochas sedimentares as mais diversas, como arenitos, siltitos, argilitos, conglomerados e calcários, além de grande diversidade de fósseis animais e vegetais de 380 M.A. ao Pleistoceno terminal (últimos 10.000 anos).

A primeira estrutura representa apenas um quantitativo de aproximadamente 10% do Estado, sendo representado pelos seguintes agrupamentos rochosos (ou litológicos), segundo Maranhão (2002):
I)       Complexo Cristalino Indiviso: aflorante em área restrita entre os municípios de Bacuri, Turiaçu, Godofredo Viana, Cândido Mendes, Luís Domingues, Carutapera, Amapá do Maranhão e Boa Vista do Gurupi (extremo Noroeste do Maranhão) e entre os municípios de Bacabeira, Rosário, Axixá, Morros, Icatu, Presidente Juscelino e Cachoeira Grande (área contígua ao Baixo Munim, na porção central da Norte do Estado, adjacente à zona costeira do Maranhão). Apresenta rochas plutônicas e metamórficas as mais diversas, com ocorrências de ouro, mármore, pedras preciosas e semi-preciosas no Noroeste do Estado. As rochas têm mais de 2 bilhões de anos;
II)     Grupo Gurupi: ocorre nos municípios do extremo Noroeste do Maranhão, como Boa Vista do Gurupi, Junco do Maranhão, Maracaçumé, Maranhãozinho, Santa Luzia do Paruá, Centro do Guilherme e Centro Novo do Maranhão. Possui depósitos auríferos e de quartzo;
III)    Granitos Brasilianos: igualmente de ocorrência restrita ao Noroeste Maranhense, este litogrupo aflora nos municípios de Governador Nunes Freire, Maranhãozinho e Maracaçumé, dotada de rochas plutônicas e metamórficas. Sua exploração econômica é, ainda, bastante incipiente.

De forma a explicar a importância desses conjuntos rochosos para o desenvolvimento das atividades econômicas estaduais, as regiões cristalinas no Maranhão apresentam potencialidades bastante aproveitadas nas últimas décadas, como o ouro, rochas ornamentais e rochas para a construção civil. Embora haja recursos minerais absolutamente importantes, as divisas econômicas geradas acabam por redefinir ocupações humanas historicamente assentadas em porções do território Noroeste do Estado.
Assim, a descoberta de recursos minerais (principalmente no século XX) implicou no aumento de procedimentos ilegais, conhecidos como grilagem[1], na tentativa de concentrar terras para a exploração dos elementos naturais mencionados. Outro agravante relacionado a este fato é a concentração de áreas para promover a especulação imobiliária de lotes para a garantia de reservas espaciais para mercados futuros. As áreas suscitadas estão presentes na Figura 02.


Figura 02: Mapa geológico do Estado do Maranhão, com destaque, em vermelho, das áreas de conflito no Noroeste do Estado.
Fonte: Maranhão (2002).

No que tange aos terrenos de natureza sedimentar, o Maranhão é composto por um conjunto de bacias que recobrem aproximadamente 90% de seu terriório, as quais são de idade e origem diferenciada. Segundo Petri e Fúlfaro (1983), o Estado é composto pelas seguintes litoestruturas:
I)             Bacia Sedimentar do Parnaíba ou Maranhão: de idade que varia de aproximadamente 420 M.A. em seus depósitos mais antigas, ao Holoceno (últimos 10.000 anos)
II)            Bacia Sedimentar Costeira de São Luís-Grajaú: cuja constituição e individualização geológica remonta ao Cretáceo (aproximadamente 100 M.A.), tendo a Formação Itapecuru como a fácie litológica de maior extensão. É capeada pelos sedimentos terciários, principalmente da Formação Barreiras (idade Mio-Pliocênica, aproximadamente 10 M.A.) e por coberturas de sedimentos recentes, compreendida geologicamente pelo termo Formação Açuí (Pleito-Holocênicas);
III)           Bacia Sedimentar Costeira de Barreirinhas: com idade geológica similar à Bacia Sedimentar Costeira de São Luís-Grajaú, apresenta configuração litológica de rochas diferenciadas. Seus ambientes de deposição, características geológicas de ambientes originais para a sedimentação e climas possibilitou a configuração de uma bacia diferenciada. Possui fácies sedimentares do Cretáceo ao Holoceno, com predomínio de arenitos (depósitos mais antigos) e areias quartzosas (sedimentos atuais e sub-atuais, na forma de extensos “lençóis” de dunas”.

Ante o exposto, convém destacar alguns aspectos relevantes sobre a Geologia do Maranhão:
a)    Nos terrenos de Embasamento Cristalino aflorante são encontrados recursos minerais dos mais diversos, como rochas do tipo granito, granodiorito e gabro, utilizadas para a construção civil, principalmente na Capital Maranhense, São Luís, dada a sua proximidade dos municípios de Rosário e Bacabeira, grandes fornecedores desses elementos. Na verdade, esses recursos têm promovido certo barateamento dos custos relacionados à construção civil na Capital do Estado e em seus municípios vizinhos. A dinamização da economia, em que pese no setor de mão-de-obra de engenharia e de obras públicas e privadas, teve um salto exponencial nos últimos anos, acompanhada com a diminuição de custos de transporte e de produção de insumos para alicerces, extraídos desses conjuntos geológicos;
b)    Na região dos municípios de Turiaçu, Godofredo Viana, Luiz Domingues, na parcela costeira Ocidental do Estado, encontra-se grande diversidade de atividades de exploração de ouro e, eventualmente, pedras semi-preciosas, isto em terrenos do Embasamento Cristalino. Contudo, dado o domínio das formas e técnicas rudimentares e artesanais de produção, a produtividade foi historicamente baixa, algo que vem mudando nos últimos anos. A região, conforme será visto no capítulo sobre fronteiras, favorece a indicação de uma nova área de dinamização econômica do Estado, caracterizada para fins do presente trabalho como “Região de Especulação para Aqüicultura, Pesca e Exploração Madeireira”. Na verdade, a fase de pré-exploração aurífera é desenvolvida pela abertura de frentes pioneiras, no caso específico, à relacionada ao desmatamento das áreas de Florestas Amazônicas. Mas detalhes serão alinhavados no item citado;
c)    Na Bacia Sedimentar do Parnaíba, as principais atividades de extração mineral são a captação de areia, calcário (para a manufatura de cal e cimento para a construção civil), halita (minério de sal – sal gema), seixos rolados (para a construção civil e paisagismo), bem como argila para as fábricas de cerâmica, tanto para as de utensílios domésticos, quanto para as de manufatura de insumos para a construção civil (tijolos e telhas). Conforme descrito no item “a”, o barateamento da prospecção, lavra e comercialização desses recursos minerais contribuíram para tamponar lacuna de insumos, principalmente na construção civil, no mercado interno. Contudo, a halita extraída faz parte da balança comercial do Estado por fornecer a sal para indústrias de insumos para a pecuária, bem como para as indústrias de produção de adubos do Sudeste Brasileiro;
d)    A exploração de petróleo e gás mineral iniciou-se ainda na década de 1950, no Sul do Maranhão, com algumas ocorrências esparsas, isoladas e não produtivas nos municípios de Balsas e São Raimundo das Mangabeiras. Contudo, desde a década de 1980, houve uma série de pesquisas desses dois tipos de combustíveis nas bacias sedimentares de São Luís e de Barreirinhas, sendo que, por sua natureza diferenciada, a segunda apresenta maior possibilidade de produção petrolífera. Ademais, é certo que existe petróleo e gás mineral na Bacia de São Luís-Grajaú, mas não se tem informações acerca de viabilidade de explotação de tais recursos. Recentemente, no segundo semestre de 2010, a empresa brasileira MPX encontrou gás mineral no município e Capinzal do Norte, a aproximadamente 250 km ao Sul de São Luís. Estuda-se o potencial de exploração do mesmo, bem como a sua possível associação com petróleo passível de exploração comercial na área. A dinâmica territorial da região em tela começa a ter novos desenhos, tendo em vista esforços governamentais e privados de agilizar os estudos para iniciar a extração de combustíveis fósseis na área Centro-Norte do Estado;
e)    Como 90% da superfície do território maranhense é composta por um conjunto denso de rochas de natureza sedimentar, sobretudo com a presença de arenitos, há grandes extensões de armazenamentos subsuperficiais de águas a diversas profundidades (aqüíferos), utilizados seja para o abastecimento humano e de manutenção de suas atividades básicas, seja para o comércio de água mineral. Esta última atividade, a captação e comercialização de água mineral, fez do Maranhão um produtor auto-suficiente, sem que houvessem esforços governamentais significativos que possibilitassem às empresas exploradoras desse recurso obterem subsídios para tal;
f)     Na plataforma continental externa, em média até 20 km ao largo da Costa Oriental do Estado do Maranhão, encontram-se depósitos de algas calcárias, passíveis de utilização na indústria de cosméticos. Tal tipo de exploração na costa submersa do Estado iniciou em meados da década de 2000, a partir de prospecções realizadas por expedições que prospectavam recursos naturais na Costa Norte Brasileira (DIAS, 2008);
g)    A Reserva Biológica (REBIO) do Gurupi, Unidade de Conservação (UC) de Proteção Integral administrada pelo Governo Federal e situada na porção Oeste do Estado, na divisa com o Pará, apresenta em subsuperfície grande quantidade de bauxita (minério de alumínio). Contudo, por determinação a Lei Federal Nº. 9.985/2000, não podem ser feitos quaisquer usos diretos (como mineração) dos recursos presentes em UC’s de Proteção Integral, como é o caso. Contudo, já existem discussões políticas para transformar a área da REBIO do Gurupi em uma Unidade de Conservação do tipo APA (Área de Proteção Ambiental), tipologia de área protegida cuja mineração, mesmo ressalvadas algumas consideração de métodos e práticas de obtenção de recursos minerais, é permitida pelo poder público;
h)   É sabido que nos terrenos sedimentares da Bacia do Parnaíba que possuem idade pré-mesozóica, ou seja, possuem mais que 250 M.A. (milhões de anos), é possível a ocorrência de carvão mineral. No entanto, o mapeamento e extensão exata desse composto petrográfico não foi realizado completamente;
i)     A plataforma continental ao largo do eixo Humberto de Campos – Araióses apresenta extenso campo de dunas sub-aquáticas, fornecedoras de sedimentos redistribuídos a longo da linha de costa e pela zona costeira continental, formando nas superfícies emersas desse setor grandes campos de dunas. Essas, pelas suas características paisagísticas e forte apelo visual, cênico, apresentam-se desde o final da década de 1990 como um dos pólos turísticos do Estado do Maranhão: o Pólo “Lençóis Maranhenses”. Com área superior a 300.000 ha (hectares), os espaços das dunas móveis, que são intercaladas por lagoas temporárias ou permanentes de águas doces, têm gerado divisas financeiras ao município de Barreirinhas, principal espaço de recepção de turistas da região. Contudo, devido à baixa incidência de fiscalizações ambientais, aliadas à ausência de sensibilização dos turistas e habitantes locais quanto ao uso dos ecossistemas associados ao Pólo, há sérios impactos ambientais que concorrem para o comprometimento da integridade dos sistemas físicos e ecológicos locais, o que pode concorrer futuramente a danos socioeconômicos à população local pelo cenário de declínio da atividade “turismo”.



[1] Na linguagem jurídica, o processo conhecido como grilagem corresponde à posse de terras realizada através da falsificação de documentos comprobatórios de titularidade, geralmente de extensas áreas.

PROBLEMAS AMBIENTAIS: UMA NECESSIDADE DE ANÁLISE CONTEMPORÂNEA

Prof. MSc. Luiz Jorge B. Dias
Geógrafo - Mestre em Sustentabilidade de Ecossistemas
Prof. Assistente I de Geografia Física (UEMA\CESI\DHG)
luizjorgedias@hotmail.com

Falar sobre questões ambientais é, antes de tudo, referir-se ao conjunto de associações e inter-relações existentes entre fatores abióticos e bióticos que compõem as paisagens presentes na superfície da Terra, sem que haja a dissonância desses elementos com as sociedades que os utilizam como recursos indispensáveis para sua existência/subsistência. Portanto, as reflexões sobre a presente temática devem versar sobre a impossibilidade de dissociação entre os componentes físicos, ecológicos e humanos.
    
Uma informação indispensável: não será aqui trabalhada a terminologia “corriqueira” meio ambiente, já que a mesma foi considerada uma redundância, já que, ao nível analítico, meio e ambiente, dependendo da abordagem e do contexto, são sinônimos, conforme explicitam Oliveira e Herrmann (2001, p. 150). A preocupação, pois, é justificar o por quê do uso das terminologias ambiente e problemáticas ambientais como alternativas terminológicas utilizadas neste estudo. Para isso, elucidações conceituais de alguns termos são desenvolvidas a seguir.
    
Considera-se ambiente o “envoltório” (Art, 1998 apud Oliveira; Herrmann, 2001) onde se pautam as relações existentes entre os elementos físico-territoriais (como a sua geomorfologia, a rede hidrográfica, a sua dinâmica climática e os solos), somadas a sua biodiversidade/biocenose (que compreende elementos fito e zoogeográficos), além da sociedade que habita ou usufrui desses caracteres citados.
     
Por problemáticas (ou problemas) ambientais, entender-se-á o conjunto de interferências, danos como um todo, que o homem causa e/ou potencializa sobre os elementos dos ambientes físico, ecológico e mesmo social, em suas várias vertentes gradativas, proporcionando mudanças consubstanciadas nos mesmos. Isso permite concluir que, analiticamente, não sejam tais processos de ordem puramente ambiental, mas socioambiental. Tal argumento é notabilizado pelo aspecto já tradicional com o qual o homem (ou agente antropogênico) observa e utiliza os elementos ambientais (físicos e ecológicos) com a finalidade de transformá-los em recursos ambientais (ou seja, dotados de valores de uso e de troca estabelecidos socioeconomicamente), os quais têm por finalidade o desenvolvimento de atividades que remetam à sua subsistência e manutenção de ciclos econômicos e mesmo de modos de produção.
    
As antropogêneses, ou interferências causadas e potencializadas pelas ações humanas, podem implicar na origem de dois tipos distintos de danos ou perturbações ambientais: os impactos, ou seja, danos passíveis de reversão a partir de investimentos de múltiplos setores da sociedade, utilizando-se da tecnologia, de conhecimentos e de recursos disponíveis para a mitigação de efeitos adversos a um dado sistema ambiental; e as degradações ambientais, ou perturbações que não são passíveis de reversibilidade ao seu estado climáxico original, uma vez que as antropogêneses têm uma impossibilidade de mitigação muito elevada, inibindo investimentos em virtude dos custos se sobreporem aos benefícios ecológico-econômicos, o que conduz a problemas sociais sérios (DIAS, 2004), comprometendo, ainda, o desenvolvimento de práticas humanas, mesmo aquelas consideradas de caráter “sustentável”.
    
No dizer de Blaikie e Brookfield (1987, apud Guerra; Cunha, 2000, p. 342), “[...] a degradação ambiental é, por definição, um problema social [...]”. E ela, em suas mais heterogêneas manifestações e implicações, somente será passível de reversão quando se resolverem problemas ligados à pobreza e às condições de miséria em que grande parte da população dos países periféricos se encontra (SACHS, 2005).
    
Aos eventos naturais que causam rupturas gradativas dos sistemas ambientais, denominar-se-á neste estudo de impacto, puramente, uma vez que eles são processos dinâmicos continuados que podem causar respostas diversas nos ambientes físicos, bem como nas comunidades ecológicas (biocenoses), mas que seguem rumo a uma manutenção de um “equilíbrio dinâmico”. Ressalta-se, no entanto, que o homem interfere nas diversas paisagens e ambientes do planeta, transformando-os segundo as suas necessidades, explícitas ou não, o que aporta num conjunto de modificações diferenciadas no decorrer do espaço geográfico produzido, do local ao global, onde as escalas de atuação e análises de eventos são fatores condicionantes para um bom diagnóstico dessas “influências” antropogênicas.
    
Afirma-se, pois, que a gama de desequilíbrios ambientais presentes na contemporaneidade reside na capacidade ora analítica, ora pragmática, de, em termos econômicos e mesmo economicistas, sustentar-se atividades, sem considerar como elemento intrínseco a este processo a sustentabilidade. Há, portanto, problemáticas não somente conceituais, mas, sobretudo, práticas no equacionamento das questões ambientais e econômicas que permeiam as relações humanas em sua totalidade, no intuito inconsciente (ou mesmo inconseqüente) de se produzir espaços para suprir necessidades sociais básicas (DIAS, 2006b).
   
O meio urbano se destaca como local aonde as problemáticas ambientais se encontram exponenciadas, evidenciando-se que é principalmente nesse conjunto de espaços onde “[...] a desconsideração das causas sociais nos problemas ambientais tem levado, na maioria das vezes, à adoção de medidas que não conseguem resolver os problemas da degradação [...]” (Guerra; Cunha, 2000, p. 345). Diz-se mais: pelo fato de se excluir a população não apenas do debate das problemáticas ambientais, mas principalmente pela marginalização de uma grande parcela demográfica no que tange ao acesso a políticas públicas ambientais que remetam a melhorias sociais, é que se tem um quadro degenerativo de índices e de configurações socioambientais.
     
Contudo, não é somente nos espaços urbanos que as problemáticas ambientais se mostram mais graves. Nas áreas rurais, conflitos de sobreposição de usos dos espaços agrários por múltiplas atividades e interesses, muitas vezes díspares, acabam por provocar danos ambientais irreversíveis em ecossistemas naturalmente frágeis. É o caso, por exemplo, do desenvolvimento de atividades agropastoris associadas à apicultura ou mesmo à piscicultura, sem que haja diagnósticos corretos e coerentes que mencionem as melhores estratégias de produção (ou o que se produz) e de produtividade (ou o que se pode lucrar com a produção) adequadas ao nível local, obviamente com uma proposta de aplicação de critérios que levem à sustentabilidade.
    
Outros fatos que merecem ser enfocados são os conflitos de uso e ocupação e as disputas pela posse das melhores “áreas produtivas”, que acabam por restringir a terra a uma mercadoria cara e socialmente inacessível, considerada apenas como um local destinado à promoção do crescimento econômico, que leva ao maior aprofundamento dos problemas sociais. Esses são fatos marcantes e que necessitam ser mais bem vistos pela sociedade civil organizada em suas heterogêneas instituições, bem como nos diagnósticos ambientais, como os zoneamentos ambientais, pois há nesse instrumento o objetivo de serem enquadradas providências que possam minimizar embates socioambientais, principalmente em locais ou regiões que são histórica e socialmente bastante vulneráveis, face ao desenvolvimento pretérito de ciclos econômicos bastante perturbadores e excludentes com respostas excludentes na contemporaneidade.
     
Dessa maneira, os danos ambientais são considerados como produtos de intervenções humanas que, por se materializarem sobre um determinado meio, tendem a “quebrar” o equilíbrio dinâmico das relações físicas e ecogeográficas historicamente estabelecidas, desnorteando estratégias práticas até então utilizadas por algumas parcelas da sociedade (geralmente de classes menos abastadas) para obter seu sustento, interferindo significativamente nas condições de vida de comunidades inteiras, que podem ser tanto de um rancho de pescadores, como de um município inteiro.
    
Por conseguinte, os danos ambientais, que possuem por sinônimos os termos problemáticas ou perturbações ambientais, não devem apenas ser estabelecidos como resultado de uma concatenação de elementos condicionantes naturais e/ou ecológicos sobre uma comunidade. Eles devem ser reconhecidos como uma integração de relações e dinâmicas articuladas com o espaço social produzido. Contudo, não se pode levar sempre à centralidade do tema o elemento homem, pois há uma conexão de todos os elementos que compõem o ambiente.
    
Da mesma forma, na análise criteriosa das questões ambientais, não se pode destacar comunidades ou sociedades “desassistidas” como apenas receptores passivos dos problemas criados por “jogos” de interesses políticos e econômicos sobre os ambientes. Isso gera, de fato, conflitos (COELHO, 2001), rupturas dos sistemas físicos, ecológicos e sociais. Mas toda Terra passa por mudanças que são tanto ocasionadas pelas ações dos grandes empreendimentos capitalistas, quanto por suínos revolvendo solos e dificultando a sua produtividade, pelo gado solto nos campos naturais, além da prática da agricultura itinerante, com métodos arcaicos (como a coivara). Essas situações reais manifestam que as atividades econômicas, independente de quais sejam, causam perturbações ambientais e somente o estudo sistemático de cada localidade poderá indicar em quais patamares de danos ambientais encontra-se a área.
    
De forma complementar, a preocupação analítica acerca dos problemas ambientais pode ser destacada no contexto das relações espaço-temporais entre uma sociedade que habita e se relaciona (social, cultural, econômica, política e ambientalmente) em um certo território e os elementos geológico-geomorfológicos e hidrológicos, além de geoecológicos, que derivam numa proposta mais abrangente de reconhecimento dos elementos/recursos ambientais que podem sustentar as atividades humanas, com manejos adequados.

Por conseguinte, todos e quaisquer tipos de aproveitamentos ambientais levam em si uma consideração clara de suprimento de necessidades humanas, sejam elas específicas para um pequeno ou grande grupo de consumidores, ao sabor do modo de produção vigente e sobre a realidade e as demandas socioculturais em questão. Em vista disto, a racionalidade ambiental é bastante exigida atualmente, ao menos ao nível conceitual e em algumas comunidades ou conjuntos destas, o que deve ser enquadrado, também, nos estudos ambientais, como nos esforços de zoneamento.
    
Ademais, a racionalização ambiental implica em sustentabilização ambiental, um equilíbrio entre as necessidades humanas, a extração e o consumo de recursos disponíveis (Leff, 2001). A isto se atrelam, também, características multi-setoriais que vislumbram um conjunto de relações geossociais, numa “[...] superestrutura ideológica, onde as relações jurídico-políticas e as ideológico-culturais subdividem-se em relações econômico-sociais (forças produtivas e relações de produção) [...]” (CAVALCANTI; RODRIGUEZ, 1997, p. 15).
    
Trabalhar as questões ambientais é, claramente, trabalhar relações, associações, interações e integrações entre elementos formadores de um ambiente (aspectos físicos/naturais, ecológicos e humanos/sociais). São elas que indicarão os graus de influências que o homem pode exercer sobre si mesmo, além do estabelecimento de suas atividades sobre um substrato físico-ecológico. Aí se encontra um meio socioambiental, ou seja, um aparato de análise que tende a ser integral, estruturando fatores espaciais que geram atividades (degradantes/impactantes, mas que bem podem ser de mitigação de danos).
 
Isso pode ser bem reproduzido pelos estudos, que se tornam convergentes, em função de um modus operandi de campos diferenciados de concepção da realidade, que se vertem a objetivos únicos, mas não unitários (Bourdieu, 1998), como os de ordem ambiental. O espaço municipal, então, é um excelente campo de análise do que vêm a ser as relações sociais e ambientais. O ambiente, então, se torna visivelmente passivo em relação aos instrumentos tecnológicos e científicos (Casseti, 1995), que estão em prol de um aparato informativo/informacional.